Cobib: biblioteca particular e coletiva — Estudo de caso de gestão de produtos

Lígia 'lilly' Freitas
9 min readSep 25, 2021

Estudo de caso de uma solução para bibliotecas pessoais, fruto do curso de Product Management da Awari, turma de junho de 2021, ministrada por Marco Canton, e com mentoria da Patrícia Torato.

Problema

A definição do produto partiu de um problema bem pessoal: como registrar de forma unificada os livros de duas pessoas que moram juntas, sendo possível identificar de quem é cada livro e, eventualmente, separar as bibliotecas sem prejuízo ao catálogo.

Essa é uma situação que casais que vão morar juntos podem passar, mas também pode ser aplicada a outras pessoas que moram juntas: filhos que ainda moram com os pais, amigos que moram juntos por algum período, ou outras configurações de famílias e coabitantes.

Descoberta

A primeira etapa do product discovery foi a realização de uma desk research para identificar se outras pessoas compartilhavam deste problema. Foram considerados três aspectos: moradia, pessoas leitoras e mercado editorial.

De um lado temos mais pessoas morando juntas:

Por outro lado, durante a pandemia também houve um aumento de 15% de divórcios ( Colégio Notarial do Brasil — Seção São Paulo), gerando rupturas em moradias.

O segundo aspecto considerado foi o quanto as pessoas leem. Conforme a 5ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, de 2019, o país tem cerca de 100 milhões de leitores, o que representa 52% da população. Destes, mais da metade indica possuir os livros lidos recentemente.

Por fim, há uma retomada no mercado editorial brasileiro. Desde 2020 houve um aumento no número de clientes de clubes de assinaturas de livros, mostrando um grande interesse na compra de livros impressos por pessoas físicas ( CNN Brasil Business, Terra). E o primeiro semestre de 2021 apresentou alta no total de exemplares vendidos e no faturamento, em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo a 7ª edição do Painel do Varejo de Livros no Brasil.

Para relacionar os dados encontrados na desk research com o problema, foi realizada uma pesquisa quantitativa para entender como as pessoas organizam suas bibliotecas pessoais. Foi criado um formulário no Google Forms, compartilhado por aplicativo de mensagens entre conhecidos, com a seguinte estrutura:

  1. Dados atitudinais: oito perguntas para entender o interesse no assunto e como se relaciona com a organização dos livros pessoais, apresentadas de forma resumida na imagem a seguir.
  2. Dados demográficos: cinco perguntas para entender o perfil do respondente, como faixa etária e região onde reside no Brasil.
  3. Entrevista: questão aberta para informar o contato, caso desejasse participar da etapa seguinte da pesquisa.
Figura 1 — Esquematização das questões atitudinais. Fonte: a autora.

O tamanho desejado da amostra foi definido como 267, após cálculo utilizando a ferramenta disponível no site da SurveyMonkey com os critérios:

  • Tamanho da população: 57.000.000
  • Grau de confiança: 95%
  • Margem de erro: 6%

A pesquisa obteve 303 respostas durante os cinco dias em que ficou aberta. Foram consideradas 296 respostas válidas para as análises, pois 7 foram desconsideradas: 3 respostas que indicaram não possuir livros em casa; 4 respostas duplicadas.

Como principais resultados, observou-se que 65,2% de pessoas organizam seus livros e, destes, 52,8% de fato catalogam os livros em algum sistema, aplicativo ou planilha de papel. Dentre os que não organizam os livros, 42,7% tem interesse em organizar.

Mais da metade das pessoas têm interesse em pesquisar na biblioteca pessoal de pessoas próximas (cônjuge, amigos, familiares). E mais de 80% das pessoas que responderam não moram sozinhas.

Foram entrevistadas três pessoas, para identificar as dores e principais casos de usos para o produto. A seguir destaco alguns trechos das entrevistas:

  • “Aplicativos parecem amadores […] falta muita coisa ou não funciona direito.” (Respondente #146)
  • “[Minha irmã] pede alguns livros emprestado e às vezes eu não sei o que eu tenho de cabeça, eu sei alguns, outros não.” (Respondente #296)
  • “Tem que acessar no computador […] uma bobajada isso de ter que verificar as coisas só pelo celular. […] Isso é uma coisa que me irrita.” (Respondente #3)
  • “Sinto falta de um aplicativo que me permita fazer mais coisas que somente dizer os livros que tenho.” (Respondente #3)

Com os dados coletados foram criadas duas personas: a persona primária, contemplada no MVP (Minimum Viable Product — ou Produto Mínimo Viável), é uma mulher jovem da Região Sul do Brasil que vai morar com companheiro e que gostaria de unificar as bibliotecas, mas sem perder a indicação de posse de cada livro. Já a persona secundária teria o foco em compartilhar parcialmente a biblioteca com pessoas que não moram juntas, como amigos e grupos de interesse.

Figura 2 — Persona primária e secundária. Fonte: a autora.

Mercado

Realizei um benchmarking para verificar a existência de solução com o foco de juntar bibliotecas. Avaliei 22 aplicativos nas lojas nas lojas de aplicativos para Android (Google Play) e iOS (App Store) e a maioria dos apps organiza livros e/ou leitura, mas de forma individual.

Alguns têm função de rede social para compartilhar avaliação ou o que está lendo, mas não encontrei sistema com a opção de agrupar coleções para coabitantes, ou criação de coleções coletivas.

Figura 3 — Diagrama com foco principal dos aplicativos avaliados. Fonte: a autora.

Dentre os 22 aplicativos avaliados nas lojas nas lojas de aplicativos para Android (Google Play) e iOS (App Store), 15 são gratuitos, 5 freemium e 2 premium. Apenas 7 possuem versão web, além de versão para smartphone.

O aplicativo de catalogação de livros mais popular na Google Play tem mais de 1 milhão de instalações.

A partir dos dados coletados, foi definido o tamanho de mercado:

  • Mercado disponível total (TAM): 100 milhões de leitores no Brasil;
  • Mercado útil disponível (SAM): 57 milhões de pessoas que possuem livros;
  • Mercado útil alcançável (SOM): 1 milhão de pessoas que catalogam seus livros de alguma forma.
Figura 4 — TAM, SAM, SOM. Fonte: a autora.

Visão de produto

Para avançar no planejamento de uma possível solução do problema, criei uma visão do produto, que abrange não só o previsto para o MVP, mas também outros aspectos pensados no roadmap.

A visão de produto do Cobib — Biblioteca particular e coletiva é: “Proporcionar aos leitores que possuem muitos livros impressos ou digitais uma melhor experiência para registrar e organizar seus livros, permitindo o compartilhamento do acervo entre coabitantes e amigos.”

Solução

Para chegar na solução inicial, estruturei o product-market fit em um Lean Canvas e criei uma tabela de proposta de valor, comparando com alguns dos concorrentes encontrados no benchmarking. Os itens em destaque nas imagens indicam os principais pontos de valor: coleção coletiva e acesso de diferentes dispositivos por versão web, não apenas aplicativo para smartphone.

Figura 5 — Lean Canvas para Cobib. Fonte: a autora.
Figura 6 — Proposta de valor do Cobib. Fonte: a autora.

Com a proposta de valor em mente, planejei a definição do produto através de umuser story mapping, focando em seis áreas e atividades principais:

  • Plataforma
  • Conta do usuário
  • Cadastro de livros
  • Empréstimo
  • Coleção residencial
  • Coleção coletiva

Foram previstos dois releases (MVP e Release 1) e os demais itens seriam backlog de versões futuras. As principais características do MVP são:

  • versão web responsiva;
  • criar coleção para residência;
  • adicionar livros a partir do ISBN (código de barras) ou manualmente e possibilidade de editar os dados;
  • indicar formato do livro (impresso, e-book, audiolivro);
  • organizar livros em categorias personalizadas;
  • adicionar anotação particular a um livro;
  • avaliar o livro com 1 a 5 estrelas;
  • indicar se já leu o livro (com datas relacionadas e progresso da leitura);
  • indicar para quem o livro está emprestado;
  • exportar dados em formato CSV;
  • perfil da conta com informações do plano e permissão para alterar e-mail ou nome cadastrados;
  • informação sobre os Termos de uso e Política de Privacidade;
  • solicitação dos dados arquivados pela empresa (LGPD).
Figura 7 — Trecho do User Story Mapping. Fonte: a autora.

Este levantamento inicial de funcionalidades levou à criação do roadmap, focando nas principais entregas de valor do produto. Quanto mais para frente o lançamento, mais incertezas existem e maior a necessidade de discovery a fazer.

Por exemplo: o lançamento após o MVP prevê o uso de Progressive Web App (PWA) e somente após avaliar o uso efetivo que seria previsto o lançamento de versões para Android e iOS.

Figura 8 — Roadmap do Cobib. Fonte: a autora.

Go-to market

O planejamento de lançamento para o mercado do Cobib — Biblioteca particular e coletiva foi definido em três etapas principais.

Figura 9 — Esquematização do plano de go-to market. Fonte: a autora.

1. Criação de uma landing page para captura de leads, apresentando as funcionalidades em uma demonstração navegável, permitindo uma interação inicial com o protótipo do produto. E uso de técnicas de inbound marketing para atrair interessados no assunto, produzindo conteúdos relevantes como dicas de organização física e digital de livros, sugestões de leitura, espaço para parcerias com autores, livrarias e editoras.

Você pode conferir a demonstração em cobib.lfreitas.info.

2. Crowdfunding para arrecadação de investimento para o desenvolvimento do MVP. Como recompensas serão buscadas parcerias para brindes, além da oferta de assinatura com desconto por um determinado tempo, criando early adopters.

3. Desenvolvimento do MVP com a verba adquirida pelo financiamento coletivo, com a contratação de desenvolvedores e designers e posterior lançamento, divulgando aos leads capturados, aos participantes do financiamento coletivo e em redes sociais.

Depois de lançado o MVP, serão realizadas novas pesquisas com os usuários e de mercado para entender os pontos de melhoria do produto e planejar as etapas seguintes, revisando o roadmap conforme necessário. Os early adopters serão incentivados a indicar o produto a seus amigos, além de seus coabitantes, e ganharão recompensas por isso.

Modelo de negócio e métricas

O Cobib — Biblioteca particular e coletiva terá como modelo de negócio o formato de assinaturas (Saas, B2C), com um plano básico individual e outro plano familiar, permitindo mais coabitantes na mesma conta. Será possível testar o sistema de forma gratuita por 15 dias.

Para medir o lançamento do MVP será considerada como métrica principal, a North Star Metric, o total de usuários que unificaram catálogos (mesmo que separem). Outras métricas do MVP são: leads na landing page; adesão ao financiamento coletivo; total de usuários cadastrados; uso das funcionalidades. Além de Net Promoter Score (NPS) como indicador de satisfação.

Tecnologia

Falando um pouco sobre tecnologia, no MVP seria possível realizar a leitura do código de barras do livro (ISBN) a partir da câmera do dispositivo utilizando HTML5 e API para captura de metadados.

Para criação do protótipo foram utilizadas histórias de usuários, como as apresentadas a seguir.

User story #1

Como estudante eu quero poder fazer anotações das leituras pelo computador para que eu possa digitar de forma mais rápida que no celular.

Critérios de aceite: campo de área de texto para inserir informações textuais em layout responsivo, acessado por navegador.

User story #2

Como compradora de livros eu quero adicionar facilmente meus livros novos para que eu não perca tempo digitando manualmente os dados.

Critérios de aceite: inserir metadados de livros digitando ou lendo ISBN.

User story #3

Como compradora de livros eu quero poder pesquisar na biblioteca da pessoa com quem eu moro para que eu não compre livros repetidos.

Critérios de aceite: vincular na busca e exibição de resultados o catálogo de um ou mais usuário do sistema, indicando a quem pertence o livro.

User story #4

Como alguém que já morou com outra pessoa leitora eu quero ter meus livros organizados de forma independente para que eu não tenha que cadastrá-los novamente em caso de mudança de casa.

Critérios de aceite: metadados e anotações dos livros devem ser vinculados ao usuário proprietário, sem perda de dados em caso de desvinculação dos catálogos.

Protótipo

Para ilustrar a ideia do produto, criei um protótipo navegável com as funcionalidades previstas no MVP, além de uma proposta de landing page para o lançamento.

Você pode conferir no site cobib.lfreitas.info ou em algumas imagens a seguir:

Tela inicial do Cobib
Tela para inserir manualmente os dados do livro no Cobib
Tela mostrando a leitura do ISBN para coletar metadados
Tela para registrar o progresso da leitura

Ferramentas e créditos

Para o desenvolvimento do projeto, utilizei ferramentas do Google (Documentos, Planilhas, Apresentações, Formulários, Data Studio), draw.io, Miro, Figma e Toggl Track.

O protótipo foi construído com PHP, Bootstrap 5 e Bootstrap Icons, escrito usando Sublime Text e versionado no GitHub.

O logotipo foi criado por Roger C. Guilherme.

O que você achou?

Este trabalho é fruto de estudos iniciais na área de product management. Se você tem alguma sugestão ou crítica construtiva, comente!

Gostou do projeto e quer saber mais? Entre em contato para trocarmos uma ideia 🙂

Publicado por Lígia Freitas originalmente no blog Biblioteconomia Nerd.

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